Atualmente, tramita no Congresso Nacional um projeto que regulamenta o homeschooling, abrindo a possibilidade de educar os filhos, exclusivamente, em casa, retirando da legislação a obrigatoriedade da educação escolar, vigente no Brasil. Em que pese todas as polêmicas e discussões a respeito do tema, é necessário ponderar os riscos desse formato, já apontados por inúmeros especialistas em educação, com impactos no desenvolvimento das crianças, na socialização e interdisciplinaridade, entre outros pilares para a formação cidadã, que são construídos, eminentemente, na escola.
Por outro lado, nosso país enfrenta a maior crise dos últimos tempos com impactos terríveis, imposta pela pandemia da Covid-19, que afastou milhares de crianças, adolescentes e jovens dos bancos escolares, a maioria de baixa renda; pais com baixa escolarização, enfrentando dificuldades, como o desemprego, a fome, entre as situações tristes que temos acompanhado, ao logo desses mais de 15 meses de pandemia. Sem falar de outros temas importantes que permeiam a educação brasileira e que precisam ser pautados, neste momento, no Congresso, como a nova regulamentação do Fundeb (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica), a implementação do Sistema Nacional de Educação, as medidas emergenciais para a educação em tempo de pandemia, a universalização do acesso dos estudantes da escola pública ao conteúdo remoto, que é um modelo emergencial adotado neste período pandêmico, entre tantas medidas prioritárias.
No caso do Maranhão, o governo Flávio Dino tem envidado todos os esforços para mitigar os prejuízos da pandemia na educação, criando meios diversos para que os estudantes tenham acesso aos conteúdos escolares: a TV Educação em canal aberto, as aulas pelo rádio, a plataforma Gonçalves Dias, a distribuições de chips com dados móveis para estudantes e professores, as atividades impressas para quem não tem acesso, a distribuição de gêneros da alimentação escolar e a Busca Ativa Escolar, só para citar alguns exemplos.
O líder de Relações Governamentais do Todos pela Educação, Lucas Hoogerbrugge, em entrevista recente, observou que medidas, nesse âmbito, são fundamentais para as famílias neste período e que não se pode confundir ensino remoto com o homeschooling. “O ensino remoto está sendo usado em um momento de emergência, de calamidade, que é o momento da pandemia, com a responsabilidade do Governo do Estado. E isso é muito importante, especialmente para as famílias mais vulneráveis, ter uma estrutura que está garantida para todo mundo pelo estado”, pontuou.
No caso do homeschooling, conforme a proposta em tramitação, é importante ressaltar que a escola pode perder seu papel protagonista na defesa e proteção social de crianças, adolescentes e jovens. “Em um país com baixa capacidade estatal, em alguns setores, como é o Brasil, você vai ter casos que, antes, eram verificados pela escola, em que a escola garantia uma proteção social para essas crianças, que a gente pode deixar de ter: situações de abuso geralmente são detectadas na escola e a escola remete esses casos para os conselhos tutelares […]”, realçou.
Notadamente, além dessa questão, o processo educacional pressupõe a interdisciplinaridade, relacionamento humano, com a troca de culturas e saberes, a promoção de iniciação científica e de descobertas, imprescindíveis em qualquer processo educacional. Também sublinho o afeto que a escola proporciona, ao ensinar sobre as relações com o outro e o respeito às diferenças, elementos que produzem uma boa aprendizagem. Obviamente, não podemos esquecer a função social e determinante dos educadores e educadoras, profissionais qualificados, especialmente, para a promoção dessa experiência educacional.
Portanto, considero a articulação do Governo Federal para a regulamentação do homeschooling inapropriada, fora de ocasião e tempo, uma vez que deixa para trás projetos estruturantes para a educação brasileira, mas, sobretudo, porque contraria todos os preceitos educacionais vigentes em nosso país. Vamos tratar o que interessa para educação, sem jamais perder de vista que o principal vetor para o desenvolvimento humano é a educação escolar.
Felipe Costa Camarão
Professor
Secretário de Estado da Educação
Membro Titular do Fórum Nacional de Educação – FNE
Membro da Academia Ludovicense de Letras e Sócio do Instituto Histórico e Geográfico do Maranhão