Enfim, 2020 nos traz algo de bom. Donald Trump não foi reeleito presidente dos EUA. A sua vitória na eleição anterior já tinha sido uma grande surpresa que o tempo tratou de explicar. Trump acionou uma grande estrutura de fakenews através de redes sociais com a ajuda do expert nesse jogo de manipulação, Steve Bannon, um desses vilões que parece ter saído das histórias em quadrinhos, mas que infelizmente habita o nosso mundo real.
O principal ponto da primeira campanha foi construir um muro na fronteira com o México para barrar a entrada de imigrantes através do país vizinho. A proposta parecia tão absurda para os tempos atuais, mas acabou encantando quem enxergou nos imigrantes a causa dos inúmeros problemas sociais e financeiros dos americanos. Foi impressionante assistir, em um mundo com tantas dificuldades, o discurso de separar pessoas, ao invés de uni-las, conseguindo ganhar corpo e prosperar.
Pesava a favor de Trump sua história de vida de empresário bem-sucedido. O típico exemplo do “sonho americano”. Depois se soube que toda a sua fortuna veio da herança do pai e a transferência foi escamoteada através da montagem de uma empresa através da qual evitaram pagar os impostos da transferência. Mesmo assim, para surpresa geral, soube-se agora que os negócios atuais dele são sustentados por grandes dívidas no mercado financeiro, mostrando que a história do empresário de sucesso pode ser só mais uma farsa que foi “vendida” ao mundo como verdade.
No campo internacional, zanzou de um lado pro outro. Só usou sua força contra os mais fracos. Ameaçou a Coreia do Norte, mas assim que os coreanos mostraram que tinham capacidade de lançar mísseis intercontinentais, tratou de ir lá apertar a mão do presidente norte-coreano. Entrou em guerras tarifárias com a China que sempre respondeu à altura e o fazia voltar atrás. Chantageou a Ucrânia, condicionando liberar um empréstimo já aprovado pelo Congresso americano. Colocou como condição que os ucranianos denunciassem o filho do seu futuro concorrente, Joe Biden, de ter feito negócios irregulares por lá. Já sentia o cheiro da futura derrota e quando o caso veio à tona teve de enfrentar o seu segundo processo de impeachment, por abuso de poder, do qual escapou “fedendo”, como dizemos por aqui.
Trump provou toda a sua maldade em vários temas. Quando surgiram os protestos pela morte de americanos negros por policiais, da sua boca não saiu sequer uma palavra de consolo para as famílias das vítimas. Deu a entender que aprovava aquele tipo de método policial que aniquila vidas, desde que fossem vidas de negros. Negou a pandemia e as mortes bateram recorde entre os americanos. Não se comprometeu com acordos climáticos e foi o Hitler dos nossos tempos ao separar pais e filhos de imigrantes, colocando-os em cidades diferentes, deportando os pais e deixando pelo menos 545 crianças em solo americano, que ainda hoje estão por lá, sem registros de quem sejam seus pais.
Joe Biden é um pequeno sopro de esperança. Americanos não brincam nesse jogo de dominar o mundo. Não há ilusão quanto a um país imperialista. Mas Biden, com suas tragédias pessoais, parece já ter pago boa parte dos seus pecados. Demonstrou ter se tornado mais conciliador. O primeiro discurso após a eleição foi equilibrado. Sua vice, Kamala Harris é uma grande novidade. Uma mulher globalizada, filha de imigrantes, negra e primeira mulher a alcançar tamanha condição de liderança na política americana. Biden e Kamala podem até decepcionar, mas comparados a Trump tem pelo menos a grande vantagem de serem reconhecidos, até agora, como espécimes da raça humana.
Por Steffano Silva Nunes