Em eleição interna dos membros do Partido Conservador, a parlamentar e ex-ministra das Relações Exteriores Liz Truss foi escolhida como nova primeira-ministra do Reino Unido, segundo anunciado oficialmente nesta segunda-feira, 5. Truss disputava a preferência dos membros do partido contra Rishi Sunak, ex-ministro das Finanças.
Truss substituirá o atual mandatário, Boris Johnson, que prometeu em julho que deixaria o cargo em meio a escândalos de reputação envolvendo o governo.
Como o Partido Conservador tem maioria no Parlamento, o nome escolhido internamente para liderar o partido no lugar de Johnson se torna automaticamente o primeiro-ministro (veja abaixo como funciona a eleição).
Truss teve a maioria dos votos dos filiados do Partido Conservador, dentre os mais de 140 mil membros que votaram. Os resultados foram:
- Liz Truss: 81.326 votos dos membros (57,4%);
- Rishi Sunak: 60.399 (42,6%).
Dentre os parlamentares do Partido Conservador, que também votam na eleição interna e ajudaram a delimitar os dois finalistas, Sunak foi o preferido, o que não impediu a derrota do ex-ministro:
- Liz Truss: 113 votos dos parlamentares;
- Rishi Sunak: 137 votos.
A gota d’água para a troca de governo no Reino Unido foi uma acusação de assédio contra um parlamentar aliado que respingou na gestão de Boris Johnson, que o havia nomeado para um cargo importante na base do governo pouco tempo antes.
Mas Johnson já vinha sendo criticado ao ser acusado de participar de festas na residência oficial durante a pandemia (escândalo que ficou conhecido como partygate) e pela inflação alta, que supera 10% ao ano no Reino Unido com as pressões inflacionárias da crise energética e guerra na Ucrânia.
O Reino Unido é composto por Inglaterra, Escócia, Irlanda do Norte e País de Gales, e a premiê eleita terá de governar regiões que somam mais de 67 milhões de pessoas. Os britânicos terminaram 2021 como a quinta maior economia do mundo, com produto interno bruto (PIB) de mais de US$ 3 trilhões. O sistema de governo é uma monarquia parlamentarista, com a Rainha Elizabeth II sendo somente chefe de Estado e o premiê, chefe de Governo, tomando as decisões políticas e econômicas na prática.
Quem é Liz Truss
Aos 46 anos, Truss é parlamentar desde 2010 e, nos últimos anos, foi ministra das Relações Exteriores do governo Johnson, tendo participação ativa nas negociações para executar o Brexit, saída do Reino Unido da União Europeia (UE).
A futura premiê prometeu na campanha acelerar reformas para, até o fim do ano, acabar com as leis remanescentes da UE no Reino Unido.
Tal como Johnson, Truss é vista como da ala “linha dura” do Partido Conservador.
Antes de ser chanceler, ela atuou também nos gabinetes dos premiês conservadores Theresa May (2016-19) e David Cameron (2010-16), que antecederam Boris Johnson.
Durante sua carreira profissional, a futura premiê também atuou como ministra da Educação, secretária de Estado do Meio Ambiente, secretária da Justiça, secretária-chefe do Tesouro e secretária de Estado do Comércio Internacional, presidente da Junta Comercial e, por último, como ministra da Mulher e da Igualdade (já no governo Johnson).
Tanto Truss quanto Sunak tentaram, durante a campanha, se colocar como herdeiros de medidas liberais e tendo a ex-premiê britânica Margaret Thatcher (1979-90), que também foi do Partido Conservador, como inspiração.
Truss promete medidas tradicionais nos costumes, mas reformas liberais na economia, como cortes de impostos. Segundo a ministra, suas medidas podem ser capazes de reverter o cenário de baixo crescimento econômico que o Reino Unido enfrentou nos últimos anos.
Na frente internacional, Truss também afirma que será dura com o presidente russo, Vladimir Putin.
“Estou honrada em ser eleita líder do Partido Conservador”, disse Truss em mensagem no Twitter. “Vou tomar medidas ousadas para nos fazer passar por esses tempos duros, crescer nossa economia e destravar o potencial do Reino Unido.”
Como funciona a eleição no Reino Unido
Mesmo que ocorram trocas internas, como no caso de Johnson, o Partido Conservador têm direito a seguir escolhendo internamente o premiê britânico até 2025, quando acaba o atual mandato no Parlamento e ocorrem novas eleições gerais.
O Partido Trabalhista, de oposição, tentou forçar eleições gerais antecipadas dado o caso de Johnson, mas o pleito não foi adiante.
Além de governar o país nos próximos dois anos, Truss deve ser ainda o nome a disputar a próxima eleição geral em 2025, se durar no cargo até lá. Um premiê pode ser tirado do cargo por uma moção de confiança no Parlamento ou pode renunciar se pressionado nos bastidores pelos próprios membros do partido (como ocorreu com Johnson).
Tanto Sunak quanto Truss, na campanha, tentaram convencer seus partidários de que eram os nomes com maiores chances de passar uma borracha no escândalo de Johnson e vencer os trabalhistas — que não têm um primeiro-ministro desde 2010 e, por ora, lideram nas pesquisas para eleições gerais.
O Reino Unido funciona com o Partido Conservador à direita e o Partido Trabalhista mais à esquerda no espectro. O partido que ganha o maior número de cadeiras nas eleições gerais escolhe o primeiro-ministro.
A última eleição foi em 2019, quando os conservadores, liderados por Johnson, ganharam maioria das cadeiras.
Os conservadores estão no poder desde 2010, primeiro com David Cameron (até 2016) – que renunciou após a vitória do Brexit em referendo -, depois com Theresa May (até 2019) e por fim com o próprio Johnson.
O último premiê trabalhista foi somente Gordon Brown (2007-10), que sucedeu o também trabalhista Tony Blair, que ficou no cargo por uma década (1997-2007).
Inflação e Brexit: os desafios do novo governo
Embora só votem menos de 200 mil partidários, a disputa no microcosmo conservador também refletiu divergências que estão expostas em todo o resto do país.
A inflação no Reino Unido é a maior em 40 anos, superando 10% em meio à guerra na Ucrânia e choques de oferta com a crise do coronavírus. O desemprego está baixo, mas há riscos crescentes para a economia com a alta de juros em todo o mundo.
Enquanto isso, a nova premiê britânica terá de lidar com os resquícios do Brexit, saída da União Europeia votada em referendo em 2016.
Embora concretizada de fato no ano passado – com apoio tanto de Sunak quanto de Truss -, a saída ainda tem problemas, o maior deles a fronteira entre a Irlanda do Norte (que faz parte do Reino Unido) e a Irlanda (que faz parte da União Europeia).
Antes de renunciar, Boris Johnson vinha ameaçando romper um acordo com a UE sobre o caso.
Fonte: Exame