O Ministério da Saúde anunciou um ambicioso plano para eliminar o câncer de colo de útero como problema de saúde pública no Brasil em até duas décadas. A doença, que é a quarta maior causa de morte por câncer no país, será combatida com uma combinação de estratégias: rastreamento precoce, novos métodos de diagnóstico, ampliação da vacinação contra o HPV e modernização do tratamento.
Com cerca de 17 mil novos casos e 7 mil mortes anuais, o câncer de colo de útero afeta principalmente mulheres que só descobrem a doença em estágios avançados. Segundo o Instituto Nacional do Câncer (Inca), quase 65% das pacientes enfrentam diagnóstico tardio.
Uma das principais mudanças será a substituição do exame citopatológico (papanicolau) por testes moleculares para detecção do HPV, principal causador da doença. Esses novos exames identificam com maior precisão a presença do vírus e sua persistência, crucial para evitar o desenvolvimento de lesões precursoras e câncer. Estudos da Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que a adoção dessa tecnologia pode reduzir os casos de câncer em 46% e a mortalidade em 51%.
Além disso, será introduzido um sistema de autocoleta, em que as pacientes poderão realizar a coleta do material para análise em casa, sem necessidade de consulta ginecológica. “Essa medida é fundamental para alcançar mulheres que se sentem intimidadas ou têm dificuldades para acessar os serviços de saúde”, explica Roberto Gil, diretor-geral do Inca.
A autocoleta já está em fase de testes em cidades de Pernambuco e São Paulo e será expandida prioritariamente para o Norte e Nordeste, regiões com as maiores taxas de mortalidade.
Embora a lei brasileira determine que o tratamento deva começar em até 60 dias após o diagnóstico, a realidade é diferente: no Norte, 65% das pacientes esperam mais de dois meses. Essa demora reflete diretamente nos índices de mortalidade, que chegam a 15% na região, contra uma média nacional de 6%.
O plano prevê aumento expressivo de colposcopias e biópsias para atender à meta da OMS, que exige rastreamento de 70% das mulheres com testes de alta performance e tratamento de 90% dos casos positivos.
Vacinação: Um Pilar Essencial
Erradicar o câncer de colo de útero depende diretamente da imunização contra o HPV. O Ministério da Saúde quer alcançar 90% de cobertura entre meninas e meninos de 9 a 14 anos. Dados mostram que a vacinação entre meninas já atinge 81%, mas cai para 56,9% entre os meninos, com cobertura especialmente baixa no Norte.
Desde abril, o Brasil adotou o esquema de vacinação em dose única, seguindo recomendação da OMS. A simplificação visa aumentar a adesão e a proteção de adolescentes antes da exposição ao vírus. Em 2024, mais de 6 milhões de doses foram distribuídas, e uma nova ferramenta permitirá monitorar detalhadamente as taxas de cobertura por faixa etária.
O diretor do Programa Nacional de Imunizações, Eder Gatti, reforça a importância de proteger adolescentes antes do início da vida sexual. “Esse é o grupo com maior potencial de proteção e menor exposição ao HPV. Vacinar cedo garante maior efetividade”, explica.
Se implementado com sucesso, o plano poderá transformar a realidade do câncer de colo de útero no Brasil, salvando milhares de vidas e promovendo igualdade no acesso à saúde em todas as regiões do país.