Imposto pelo presidente Getúlio Vargas em 1937 para instaurar a ditadura do Estado Novo, um estado de emergência voltará a ser implantado no país e a existir na Constituição caso seja aprovada, do jeito que está, a proposta de emenda que concede benefícios que hoje custariam R$ 41 bilhões.
A versão getulista da medida, incluída na Constituição de 1937 e que vigorou até 1945, previa a adoção do estado de emergência em casos, entre outros, de conspiração que pudesse perturbar a paz pública, pôr em perigo as instituições e a segurança do Estado – os pretextos de sempre usados na implantação de uma ditadura.
A decretação da emergência dava ao ditador o direito de determinar censurar correspondência e comunicações, suspender a liberdade de reunião e de fazer busca e apreensão em domicilio.
Desta vez, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) não fala em possibilidade de entrega de poderes excepcionais ao presidente, mas em concessão de benefícios que amenizem o impacto da crise internacional. Fala em reconhecimento, em 2022, do “estado de emergência decorrente da elevação extraordinária e imprevisível dos preços do petróleo”.
Neste caso, reconhecerá a existência de algo que hoje não é previsto na Constituição: o próprio estado de emergência. O texto constitucional fala em estado de defesa, estado de sitio e estado de calamidade pública – este, citado na PEC do Orçamento de Guerra, que autorizou gastos excepcionais na pandemia da Covid.
Ao não prever o estado de emergência, a Constituição não o define, não estabelece seus limites, não diz o que pode ou o que não pode ser feito durante sua vigência – caso o texto da PEC aprovado pelo Senado seja mantido pela Câmara dos Deputados, as eleições seriam realizadas com o Brasil sob um indefinido estado de emergência.
Professor de direito constitucional, o deputado Marcelo Ramos (PSD-AM) afirma que a criação do estado de emergência é uma “invenção perigosa”. “Inventar algo não previsto na Constituição abre precedente, pode tudo”, acrescenta. Um ministro do Supremo Tribunal Federal também ouvido pela coluna foi outro a usar uma palavra derivada de “perigo” ao analisar o caso: “Parece que estão inventando algo perigoso…”, alerta.
Outro ministro do STF ressalta que a simples aprovação da PEC fará com que o estado de emergência passe a constar da Constituição. “Isso porque ela introduz algo de novo no próprio texto constitucional”, frisa. Ele observa que uma PEC aprovada pelo Congresso só pode ser invalidada pelo STF “nos casos excepcionalíssimos em que haja ofensa flagrante a uma cláusula pétrea.”
Tais cláusulas vedam mudanças que possam abolir a federação, o exercício do voto, a separação dos poderes e os direitos e garantias individuais.
A retirada, do texto da PEC, da implantação do estado de emergência é um dos pontos que estão sendo analisados pelo relator da proposta na Câmara, o deputado Danilo Forte (União Brasil-CE). Com isso, ele evitaria alguns questionamentos, mas abriria brecha para a contestação da legalidade da medida.
Algumas das benesses previstas infringiriam a lei eleitoral, que proíbe a concessão de algumas das bondades em ano eleitoral, “exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência”. Fica, portanto, o dilema. Para driblar a lei, a PEC teria que respeitar a própria lei – que fala em estado de emergência – e se respaldar em algo que não existe na maior das nossas leis.
Debate
A CNN realizará o primeiro debate presidencial de 2022. O confronto entre os candidatos será transmitido ao vivo em 6 de agosto, pela TV e por nossas plataformas digitais.
Fonte: CNN Brasil