Por Revista Galileu
Um homem se apaixona por uma mulher que irá casar com outra pessoa e comete suicídio. Este é o enredo de Os Sofrimentos do Jovem Werther (1774), escrito por Johann Wolfgang Goethe. A obra poderia ser mais uma trágica história de amor da literatura, mas levou a um grande problema: o suicídio de muitas pessoas na Europa que se mataram usando uma pistola e roupas parecidas com as do protagonista.
De tão significativo, o caso foi usado para nomear o Efeito Werther, que é quando ocorre um aumento do número de suicídios depois de um caso amplamente divulgado. O termo foi proposto pelo pesquisador americano David Phillips, em 1974.
Segundo Karen Scavacini, psicóloga e diretora do Instituto Vita Alere, em São Paulo, o suicídio por imitação só acontece quando a pessoa já está em um estado de vulnerabilidade. De acordo com a especialista, a maior probabilidade de ocorrer o suicídio por imitação é quando há uma identificação um personagem, uma pessoa pública ou até mesmo um colega de escola. “Também depende de como é retratado na mídia, se for muito romantizado, trouxer informações simplistas ou dizer que a pessoa encontrou paz”, exemplifica.
Recentemente tivemos um exemplo do Efeito Werther com a série 13 Reasons Why. Estudos mostraram aumento de suicídio entre adolescentes nos meses após a estreia do programa, que conta a história de Hannah Baker, uma jovem estudante que tira a própria vida. “O Efeito Werther realmente existe e essa série da Netflix cometeu muitos erros que os principais manuais orientam a não fazer”, avalia o psiquiatra Neury Botega, autor de diversos livros sobre suicídio.
Entre os problemas citados pelo psiquiatra estão: cada episódio culpar uma pessoa ou um acontecimento, a glorificação da Hannah Baker (chegando ao ponto de mostrar o armário dela transformado em altar) e ainda mostrar detalhes sobre o método que ela usou em uma longa cena. “Tudo isso é contrário às recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e de outras instituições que batalham na prevenção [do suicídio]“, destaca Botega .A cena do suicídio da personagem — que recebe críticas desde 2017 — foi removida em julho deste ano da série, que está na terceira temporada.
Publicado na revista JAMA Psiquiatry, o estudo mostra um aumento de 13% no número de suicídios de norte-americanos de 10 a 19 anos entre abril e junho de 2017 — os três meses seguintes à estreia do seriado. Em relação ao gênero, o crescimento foi de 12% para os meninos e 21% entre meninas. Ainda não há uma pesquisa dizendo qual foi o efeito no Brasil.
A situação também acontece quando famosos cometem suicídio e isso se torna público. Em que uma pesquisa divulgada na revista científica PLOS One, notou-se que os casos nos Estados Unidos aumentaram logo após o ator Robin Williams se matar em 2014. O estudo diz que, nos cinco meses seguintes à morte do ator, houve 10% mais casos que o esperado para o período: 18.690 pessoas tiraram a própria vida entre agosto e dezembro de 2014; sendo que 16.849 casos eram esperados com base na série histórica.
No caso de suicídio de pessoas próximas, como amigos e familiares, Botega afirma que é preciso ainda mais cuidado. “Pessoas que estão vivendo o luto de alguém por suicídio merecem uma atenção especial porque elas sofrem de sentimentos muitas vezes contraditórios. É uma sensação de culpa muito grande, muitas vezes uma vergonha ou receio de falar sobre o assunto com outras pessoas”, explica o psiquiatra.