A abstenção nas eleições virou tema-chave nas campanhas, com 20,79% do eleitorado que vota no Brasil sem ter ido às urnas no primeiro turno, um recorde. Ao todo, quase 32,4 milhões de eleitores que estavam regulares não votaram — além de outros 330 mil ausentes no exterior, que fazem a taxa geral de abstenção chegar a 20,91%.
Na disputa presidencial, com pouco mais de 6 milhões de votos de diferença no primeiro turno entre o ex-presidente Lula (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL), o comportamento desses eleitores ausentes têm sido observado com atenção. Veja abaixo os principais números da abstenção em cada estado no primeiro turno.
Rio de Janeiro é destaque em abstenções
Percentualmente, os estados com maior taxa de abstenção, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), foram:
- Rondônia (quase 24,6% de abstenção)
- Mato Grosso (23,4%)
- Rio de Janeiro (22,7%).
Nos três, o presidente Jair Bolsonaro venceu no primeiro turno (veja aqui os resultados por estado).
Dentre eles, porém, o Rio é o que tem também parcela mais significativa em votos absolutos: ao todo, quase 3 milhões de eleitores não votaram.
Enquanto Bolsonaro venceu com folga no Rio (tendo mais de 51% dos votos), uma das preocupações da campanha do ex-presidente Lula é aumentar o comparecimento de eleitores no segundo turno — mesmo nos estados nos quais foi derrotado.
As periferias das grandes cidades são os principais alvos, além de grupos como mulheres e estratos de menor renda, onde as pesquisas de opinião mostram que o petista têm mais votos do que o presidente Bolsonaro.
Por isso, o Rio tem sido um dos alvos da agenda de Lula nas últimas semanas. A campanha do ex-presidente fez três eventos no Rio no segundo turno, na cidade de Belford Roxo, no complexo do Alemão, na capital, e nesta quinta-feira, 20, em São Gonçalo, na região metropolitana.
7,5 milhões não votaram em SP
Em números absolutos, além do Rio, os outros dois maiores colégios eleitorais da região Sudeste, São Paulo e Minas Gerais — que têm sido vistos como decisivos nesta eleição —, também mostram o tamanho do impacto das abstenções no primeiro turno.
Só em São Paulo, quase 7,5 milhões de eleitores não votaram, enquanto em Minas, o número foi de 3,6 milhões.
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Outro destaque é a Bahia, reduto eleitoral de Lula e onde o ex-presidente teve quase 70% dos votos, perdendo em só duas cidades. A abstenção no estado foi percentualmente acima da média nacional (ficou em 21,3%), ainda que tenha sido menor na capital, Salvador (17,92%, uma das mais baixas do país).
Em números absolutos, a abstenção deixou longe das urnas 2,4 milhões de eleitores baianos. No dia 30 de outubro, além da votação presidencial, o estado terá segundo turno entre Jerônimo Rodrigues (PT) e ACM Neto (União) para governador, um elemento que pode evitar que a abstenção aumente ainda mais entre os baianos.
Por que o Brasil vive recorde de abstenção
Historicamente, a abstenção no Brasil é menor do que em democracias ocidentais onde o voto não é obrigatório. Ainda assim, vinha em uma crescente mesmo antes destas eleições.
A eleição de 2022 teve o pior comparecimento desde 1998, quando Fernando Henrique Cardoso foi reeleito em primeiro turno e as ausências também chegaram a um pico — já passada a “novidade” do retorno do voto presidencial em 1989, que foi a primeira eleição para o cargo pós-ditadura e também a com menor abstenção, de só 12%.
Depois do ápice de 1998, a abstenção caiu ano a ano, até que, de 2006 em diante, voltou a subir (veja no gráfico).
“A abstenção no Brasil tem tido crescimento constante, gradual e pequeno. A cada eleição cresce um pouco. Isso pode ser explicado pelo fato de o eleitor estar entendendo que não votar gera punição somente administrativa”, disse em entrevista anterior à EXAME antes do primeiro turno o professor Emerson Cervi, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), que estuda o fenômeno no Brasil.
A leitura geral é de que as abstenções prejudicaram mais Lula do que Bolsonaro no primeiro turno, com ausências numerosas de eleitores nas periferias. Por outro lado, homens também votaram menos do que mulheres (com abstenção de 22% deles e 20% delas). A abstenção masculina maior é um comportamento que já ocorreu em outras eleições e pode também tirar milhares de votos de Bolsonaro, que é preferido por esse eleitorado, sobretudo em cidades grandes e médias na região Sudeste, onde o presidente tem alto número de votos.
Quem não votou no primeiro turno pode votar no segundo
Pela lei eleitoral, mesmo eleitores que não votaram no primeiro turno podem votar no segundo. Segundo o TSE, cada turno é tratado como uma eleição independente pela Justiça Eleitoral.
Apesar disso, a abstenção no segundo turno costuma ser ainda maior do que no primeiro. Em 2018, enquanto 117,4 milhões votaram no primeiro turno, só 115,9 milhões votaram no segundo. Com o pleito se desenhando para ser apertado, uma diferença como essa, se repetida em 2022, pode ser decisiva no resultado.
Pesquisadores apontam que a redução no comparecimento na segunda etapa se deve a fatores como a identificação com os candidatos, uma vez que, no primeiro turno, há eleição para deputado, senador e governador, que podem ter maior proximidade regional com alguns eleitores.
Neste segundo turno, só 12 estados têm disputa para governador. Minas e Rio de Janeiro (respectivamente segundo e terceiro maiores colégios eleitorais) são exemplos de lugares onde não haverá eleição para governador, somente para presidente — um potencial risco para aumento da abstenção em grupos que já se ausentam mais.
Com menos cargos em disputa, eleitores que não estão amplamente engajados nas campanhas presidenciais podem estar menos motivados a se deslocar para votar, segundo as pesquisas na área. Para os presidenciáveis, portanto, não bastará “virar um voto” na reta final, mas garantir que o eleitor conquistado de fato votará em 30 de outubro.
Fonte: Exame