Quando o governador do Maranhão, Flávio Dino, anunciou, no último dia 17, sua saída do PCdoB após 15 anos no partido, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) enviou nos grupos de WhatsApp da militância um áudio emocionado e melancólico.
– Recebi uma notícia que me deixou muito triste: Flávio Dino deixou o PCdoB. Infelizmente mudou o rumo. (…). Mas nós comunistas estamos voltando para a moda. Teve aquela crise lá na União Soviética, mas a China já é o país mais importante do mundo hoje. Do jeito deles, no rumo do socialismo – apontou.
Segundo dirigentes da legenda, Dino, único governador comunista da história do país, surpreendeu a todos ao não cumprir o combinado de esperar a votação no plenário da Câmara dos Deputados um projeto do Senado, de autoria de Renan Calheiros (MDB-AL), que permite a dois ou mais partidos se reunirem em uma federação para que ela atue como se fosse uma única sigla nas eleições.
O mecanismo é visto como a tábua de salvação da legenda.
Se for aprovado, o projeto prevê que depois da eleição esse “casamento” tem de durar pelo menos uma legislatura de quatro anos. Ou seja: os federados serão obrigados a atuar como uma bancada no Congresso, embora possam manter símbolos e programas. Nesse cenário, o PCdoB vislumbra formar uma coalizão com PSB, PSOL, Solidariedade e PDT, ou mesmo se unir a apenas um deles para seguir em frente, mantendo a foice e o martelo na ponta da bandeira vermelha.
– O partido é como um trem, tem um destino e vai em uma direção. Mas tem estações no caminho nas quais pessoas entram e saem. O importante é seguir no rumo definido – concluiu Silva.
Autoproclamado o partido mais antigo do Brasil, o PCdoB planeja comemorar o centenário em março de 2022 sem saber qual será o destino e dividido sobre o que fazer, caso não vingue o projeto no Congresso. Líderes de bancadas e parlamentares acham que o texto das federações tem poucas chances de aprovação em um cenário dominado pelo Centrão.
Ameaça
Se isso acontecer, o PCdoB, que sobreviveu ao governo militar, atuou na clandestinidade e organizou a Guerrilha do Araguaia, vai ficar ameaçado de extinção da vida partidária institucional. O motivo é a cláusula de barreira, um mecanismo criado em 2017 que funciona como uma espécie de filtro.
Para que as legendas não sejam barradas na Câmara, precisam ter uma votação mínima nas eleições gerais.
Quem passa pela cláusula obtém recursos públicos, tempo de TV e estrutura na Câmara. Na disputa de 2018, a exigência foi para que candidatos à Câmara dos Deputados somassem ao menos 1,5% dos votos válidos em nove Estados, com 1% dos votos em cada um deles. Em 2022, esse piso pulará para 2% (ou eleger 11 deputados) – o piso aumenta de forma progressiva até chegar a 3% na eleição de 2030.
Oficialmente, o PCdoB informou que esse assunto ainda não está em pauta no Comitê Central, mas nos bastidores os “cabeças brancas” – ou seja, a ala jovem da legenda – pregam uma fusão partidária, sendo o PSB o partido mais citado. Nesse caso, porém, seria necessário mudar o nome, o programa e a bandeira, que perderia a foice e o martelo.
O marxismo-leninismo que norteia a ação do partido certamente teria de ser suavizado ou mesmo excluído do estatuto.
– Se não for aprovada [a federação], vamos fazer um esforço em um processo de unificação que assegure a identidade. O PCdoB não abre mão de manter sua identidade política e ideológica. Se isso também não der certo, estamos discutindo outras alternativas – disse o advogado e ex-deputado Constituinte Aldo Arantes, de 82 anos , que está no Comitê Central desde 1972.
A neta de Luís Carlos Prestes, a cientista política Ana Prestes, de 43, concorda.
– Vamos manter independência programática e nossa identidade, sem mudar símbolo e nome. Essa ideia de mudar não teve adesão no partido – destacou.
Fonte: Pleno News